Original Article: American Acoloytes: Vivekananda’s Intellectual Legacy in the US
Author: Vinay Lal

*Acólitos Americanos: O Legado Intelectual de Vivekananda nos EUA

Parte III de Vivekananda e Tio Sam: Histórias, Estórias, Política

Seriam quatro anos antes de Vivekananda achar seu caminho de volta à Índia. Uma das estórias mais frequentemente recontadas sobre ele, sem dúvidas para ambos transmitir um senso de sua proeza intelectual e, também, seu compromisso obstinado com a ideia de serviço, é a de que, no que seguiu o Parlamento, foi-lhe oferecida uma cadeira universitária em Filosofia Oriental na Universidade de Harvard, mas, ciente de sua própria tarefa em servir os pobres na Índia e continuar a missão de Sri Ramakrishna, ele negou o convite. Harvard não mantém relatos de tal oferta a Vivekananda, nem ninguém foi capaz de fornecer qualquer evidência para apoiar essa alegação; porém, como muito do que é contado sobre ele, esta estória não requer corroboração do ponto de vista daqueles que o viam como um dignatário espiritual e intelectual. A estória recebeu muitos embelezamentos: por exemplo, de acordo com uma versão publicada em nenhum lugar menos que o Wall Street Journal em 2012, Vivekananda foi convidado a presidir o departamento de filosofia de Harvard; supostamente, a Universidade Columbia, ao mesmo tempo, fez uma oferta por Vivekananda quando a oferta da Harvard foi trazida à atenção deles.

Pode ainda ser que a busca pela “verdade” não é completamente pertinente: o que é certo é que Vivekananda adquiriu um considerável número de seguidores, e há histórias de empreendimentos americanos intelectuais e culturais que são agora de maneira insolúvel entrelaçados com o nome de Vivekananda. O papel feito por duas mulheres da Nova Inglaterra, Sarah Farmer e Sara Chapman Bull, de criar um retiro espiritual, Green Acre, onde Vivekananda discursava frequentemente sobre filosofia indiana e conduziu uma aula sobre Yoga Raja durante vários meses, é apenas uma das muitas ilustrações de suas habilidades de comandar seguidores entre alguns setores influentes e, certamente, bem colocados na sociedade americana. Com o que veio a ser conhecido como as Conferências de Cambrigde, realizadas em dezembro de 1894, na vizinhança de Harvard, com a instigação de Sara Bull, Vivekananda estrelou como palestrante principal. Os convidados que participaram de sua palestra incluiam Charles Lanman, professor de sânscrito e editor do Harvard Oriental, James; Ernest Fenollosa, uma das autoridades liderantes do mundo em arte japonesa; e o filósofo William James. Um colega da Harvard de William James é relatado de ter comentado que o indiano Swami ‘tinha o professor James a seus pés’; mas o que é inequivocamente claro é que James citou um pouco do tratado de Vivekananda sobre Yoga Raja em seu trabalho altamente influente, As Variedades da Experiência Religiosa.

Vivekananda with some female supporters in Pasadena, California, in 1900.  Photo: Vedanta Society of Southern California

Vivekananda com algumas de suas seguidoras em Pasadena, Califórnia, em 1900. Foto: Sociedade Vedanta do Sul da Califórnia

Vivekananda estabeleceu a Sociedade Vedanta em Nova York em 1894, e outra filial em São Francisco em 1900, em sua segunda visita aos Estados Unidos. Vivekananda morreu em 1902, mas a institucionalização do Vedanta nos EUA estava no caminho certo dentro de alguns anos após sua morte. Em 1929, havia centros Vedanta em Boston, Chicago, Pittsburgh, Portland, e Providence, e três apenas na área de Los Angeles - Pasadena, Hollywood, e La Crescenta. Um dos capítulos mais surpreendentes no crescimento do Vedanta nos EUA - uma narrativa que chama atenção às instigações aos intelectuais ocidentais, especialmente após a Primeira Guerra Mundial, que havia prejudicado enormemente os jovens homens e trazido para casa aos milhões de europeus a devastante e amedrontadora ideia de “guerra total” - seria escrito no sul da Califórnia, onde o jovem monge, Swami Prabhavananda, que foi enviado de São Francisco para Hollywood pela Ordem Ramakrishna em 1929, eventualmente uinu um renomado grupo de escritores e intelectuais britânicos ao redor dele, incluindo Aldous Huxley, Christopher Isherwood, e Gerald Heard. Prabhavananda e Isherwood juntos produziram traduções de um número de textos filosóficos-hindu essenciais - o Bhagavad Gita, Vivekachudamani de Shankara, e os Aforismos da Yoga de Patanjali - publicadas na série Mentor Library e então teve um papel crucial em popularizar a filosofia indiana. Podemos dizer que o interesse de Hollywood na ‘espiritualidade oriental’ foi atiçado por Isherwood, cujas conexões com cinema, arte, e círculos literários eram prolíficos. Enquanto isso, na costa leste dos Estados Unidos, Swami Nikhilananda, que fundou o Centro Ramakrishna-Vivekananda em Nova York em 1933 e serviu como ministro do mesmo até sua morte em 1973, reuniu a seu redor um bando de seguidores igualmente ilustres, alguns presentes em pessoa e outros em espírito. A tradução para o inglês de Sri Sri Ramakrishna Kathamrita, feita por Swami Nikhilananda, reproduzida como Evangelho de Sri Ramakrishna, daria a ele um amplo número de seguidores, e, nos anos seguintes, seus devotos incluíam George Harrison e o recluso J.D. Salinger. Em uma carta endereçada à Nikhilananda em 19 de janeiro de 1972, Salinger escreveu: “Às vezes, eu desejo que o oriente tivesse se dignado a concentrar alguma parte pequena de sua imensurável genialidade à insignificante arte ou ciência de manter o corpo bem e em forma. Entre a indiferença extrema ao corpo e a mais extrema e zelosa atenção para com ele (Hatha Yoga), parece não haver qualquer meio termo útil, e isso me parece mais uma tristeza desnecessária em Maya”. Salinger tinha um relacionamento intensamente pessoal com Swami Nikhilananda; conforme o venerável monge mostrou sinais de envelhecimento, Salinger oferece a ele este conforto: “Sua voz soa a mesma, apesar disso, Swami. Pode ser que ler a um grupo devotado do Evangelho de Sri Ramakrishna seja tudo que você faz agora, como você diz, mas imagino que os estudantes que são sortudos suficientes para escutá-lo nessa leitura colocariam a situação um tanto quanto diferente. O que significa que eu esqueci muitas coisas válidas e importantes na minha vida, mas eu nunca esqueci o modo como você costumava ler e interpretar Upanishads em Thousand Island Park”.

Vivekananda in front of the Pasadena house that is now his namesake.

Vivekananda em frente à casa que ficou durante seu tempo no sul da Pasadena, Califórnia. A casa agora leva seu nome.

Não há dúvidas de que memórias de Vivekananda mantêm-se na imaginação americana. Uma casa vitoriana no sul da Pasadena, onde Vivekananda ficou durante seis semanas em 1900, agora está sob cuidados da Sociedade Vedanta do Sul da Califórnia. O Colégio de Oração Trabuco, estabelecido por Gerald Heard em 1941 como um retiro silencioso para meditação, no meio de 300 acres de terra nas colinas de Santa Ana ao sul de Los Angeles, foi entregue à Sociedade Vedanta em 1949 e re-dedicado como o mosteiro de Ramakrishna. Dois anos depois, uma estátua de Vivekananda, modelada a partir de uma que havia sido estabelecida no Centro Ramakrishna-Vivekananda em Nova York, seria posta no monastério Trabuco Canyon. Significativamente, a cerimônia de dedicação aconteceu em 4 de julho: assim uma tentativa seria feita, uma que está para ser testemunhada repetidamente nas cerimônias inovadoras que acompanharam a inauguração de novos locais para templos hindus nos Estados Unidos, para sincronizar a noção de liberdade política corrente nos EUA com a ideia de liberdade espiritual, uma ideia que muitos hindus educados de classe média acreditam ter atingido seu apogeu na civilização indiana. (Swami Prabhavananda, à parte, morreu em 4 de julho de 1976, exatamente no bicentenário da Declaração da Independência Americana. Esta foi apenas uma coincidência, ou havia Swami desejado que este fosse seu dia de morte?). Por mais que a América, nessa visão, possa representar a culminação da ideia de liberdade de expressão e as liberdades materiais que têm de definir a vida moderna, Vivekananda, o emissário de uma civilização antiga que há muito lida com a noção de emancipação espiritual, foi necessário no ocidente para realizar a própria ideia de liberdade.

(A parte final, parte IV, será postada em breve.)

Ver também Partes I e II, os posts anteriores nesse blog.