Original Article: Vivekananda at the World Parliament of Religions
Author: Vinay Lal

*Vivekananda No Parlamento Mundial das Religiões

Parte II de Vivekananda e Tio Sam: Histórias, Estórias, Políticas

Foi o Parlamento Mundial das Religiões que primeiramente trouxe os americanos frente à um emissário vivo do ‘Hinduísmo’, uma circunstância forjada com ironias. O próprio Parlamento era uma dos vários congressos convocados em 1893 para celebrar a descoberta quadricentenária de Colombo das Américas. Conforme Colombo atingiu a terra nas Américas, ele imaginou que tinha chegado à India. Não precisamos nos deter aqui por uma consideração das consequências abrangentes deste erro - nenhuma tão nefasta quanto o genocídio das nativos americanos - exceto sugerir que, em uma maneira de falar, Vivekananda chegou aos Estados Unidos no despertar desse erro. Se o que chegou a ser celebrada como a inclusão da sociedade americana baseou-se em uma exclusividade que pedia por nada menos que o extermínio em massa das pessoas das Américas e a escravidão subsequente dos africanos, a Exposição Colombiana Mundial ecoaria essa visão do mundo. O Parlamento anunciou-se como a maior reunião mundial de representantes religiosos do mundo, e um estudioso tão eminente quanto Max Muller, um dos pioneiros do estudo comparativo da religião, simbolizou sua aprovação do projeto com a observação de que o Parlamento “permanece único, sustenta-se sem precedentes na história completa do mundo.” Ainda assim, religiões índio-americanas foram excluídas, na suposição de que os americanos nativos, mesmo que não sem cultura, não poderiam ser vistos como possuindo algo que possa ser chamado de “religião”; de mesma maneira, na medida em que os africanos (e afro-americanos) receberam qualquer representação, foi apenas até o ponto em que eram membros de alguma denominação cristã.

Dez religiões foram concebidas pelos organizadores como as grandes religiões do mundo e convidadas a mandar seus representantes; ao lado de três religiões abraâmicas - judaísmo, cristianismo e islamismo - e do Zoroastrismo, estavam seis religiões originárias do sul da Ásia e do extremo oeste: taoísmo, confucionismo, xintoísmo, hinduismo, budismo, e jainismo. Alguns líderes cristãos opuseram-se ao Parlamento com o fundamento de que fornecia igualdade para todas as religiões e, assim, enfraquecia o cristianismo, “a única religião”, como descrita pelo arcebispo de Canterbury. “Eu não entendo”, escreveu o arcebispo em uma carta aos organizadores, “como a religião pode ser vista como um membro de um Parlamento de Religiões sem assumir a igualdade dos outros membros pretendidos e a equivalência de suas posições e alegações”. Com relação aos procedimentos do Parlamento, a maior preponderância de papéis residiu no cristianismo - 152 de 194, para ser mais preciso. Virchand Gandhi apareceu como o único porta-voz para o jainismo; hoje sua estátua encontra-se fora do templo de Jain em Chicago, um emblema da gratidão da comunidade por ter trazido visibilidade para uma fé que havia sido historicamente limitada à Índia.

Foi no 11 de setembro, agora um dia de infâmia na América, que James Cardinal Gibbons abriu o Parlamento ao liderar os delegados na oração do Senhor. No Parlamento, apenas dois representantes falaram em nome do islamismo - uma participação um tanto quanto remota, considerando o fato de que o cristianismo e islamismo haviam se encontrado repetidamente através dos séculos, e, nem sempre, embora o entendimento popular do islamismo no oeste, como religiões hostis. Em retrospectiva, a extraordinariamente minúscula presença do islamismo no Parlamento Mundial em 1893 pode ser lida como uma premonição do fato de que o islamismo e o cristianismo têm uma grande quantidade de terreno para cobrir se vão empenhar-se em um genuíno diálogo inter-religioso. Para a diáspora indiana mundial, o 11 de setembro pressagia outras possibilidades. Mais de uma década após Vivekananda entregar seu discurso entusiasmado, do outro lado do mundo em Johannesburg, Gandhi reuniu-se com amigos, associados, e “delegados de vários lugares no Transvaal” na noite de 11 de setembro, em 1906, para considerar como os melhores índios sul-africanos poderiam resistir às injustiças impostas neles. Tal foi, nas palavras de Gandhi, “o advento de satyagraha”, o termo que ele cunhou para sinalizar não apenas o nascimento de um novo movimento de resistência pacífica, mas uma visão de mundo completa. Porém, essa é outra estória: de volta em Chicago, na tarde de 11 de setembro em 1893, Vivekananda subiu ao palco e o hinduísmo foi, na visão recebida, propelido no palco mundial. Vivekananda compartilhou o estrado ao lado de outros “representantes” do hinduísmo: dentre estes, havia Sido Ram, “um escritor de recurso” de “Multan, Punjab”; o reverendo B.B. Nagarkar, um ministro do “Brahmo-Samaj” de Bombaim; professor G.N. Chakravarti; Jinda Ram, presidente da Sociedade de Temperança, Muzaffargarh; e o reverendo P.C. Mozoomdar, ministro e líder do “Brahmo-Samaj” de Calcutá. Esses outros nomes estão agora perdidos na história - o que quer que tenham dito, eles parecem ter sido deixados de lado por Vivekananda. E, ainda assim, Virchand Gandhi, falando em nome do jainismo, forneceu uma perspectiva diferente: “não apenas Vivekananda, mas todos os indianos delegados”, Virchand Gandhi escreveu, “eram ótimas pessoas, e, pelo menos um terço, às vezes dois terços, de uma grande audiência...se apressaria para as saídas quando um bom orador da Índia terminasse seu discurso.”

Swami Vivekananda (center-right) with Virchand Gandhi (left) and Anagarika Dharmapala (center-left) at the World Parliament of Religions in Chicago, 1893.

Swami Vivekananda (direita central) com Virchand Gandhi (esquerda) e Anagarika Dharmapala (esquerda central) no Parlamento Mundial das Religiões em Chicago, 1893.

Pelo que consta, e estas não são apenas narrativas que vieram de seus acólitos e outros defensores do nacionalismo Hindu, Vivekananda tinha um impacto arrebatador em sua audiência. “Irmãs e irmãos da América”, Vivekananda procedia em dizer - e com isso ele trazia sua audiência de 7,000 pessoas a seus pés. O ministro presbiteriano, reverendo John Henry Barrows, a quem a organização do Parlamento havia sido confiada, escreveu em sua história de dois volumes do Parlamento que as palavras iniciais de Vivekananda eram seguidas de “uma salva de aplausos que durava por vários minutos”; segundo seu próprio testemunho, Vivekananda era o orador mais popular do Parlamento. Uma vez que o som dos aplausos abaixasse, Vivekananda agradecia as pessoas presentes “em nome da ordem de monges mais antigos do mundo”, “em nome da mãe das religiões”, e ‘em nome de milhões de pessoas hindu de todas as classes e seitas”. Vivekananda declarou-se orgulhoso “de pertencer a uma religião que ensinou ao mundo ambos tolerância e aceitação universal. Acreditamos não apenas na tolerância universal, mas aceitamos todas as religiões como verdade. Estou orgulhoso de pertencer a uma nação que abrigou os perseguidos e refugiados de todas as religiões e de todas as nações na Terra”. Vivekananda levaria para casa o que via como o caráter essencialmente ecumênico da sensibilidade religiosa indiana, e particularmente hindu, lembrando a audiência de um hino que ele lembrava repetir na infância, “como os diferentes riachos tendo suas fontes em lugares diferentes todos misturam suas águas no mar, então, o Senhor, de diferentes caminhos que o homem pega por tendências diferentes, por muitos que pareçam ser, certo ou errado, todos levam a Ele.”

No discurso de abertura de Vivekananda, o primeiro de muitos que ele ainda ia proferir ao Parlamento, já estão presentes, no entanto, de algum modo, todos os traços característicos das estratégias interpretativas que ele deveria implementar com grande efeito em suas performances públicas no Ocidente. Não há contestação de que a Índia deu abrigo ao “remanescente da grande nação zoroastrista”, assim como tinha dado hospitalidade aos judeus sendo perseguidos em grande parte do resto do mundo. Sua audiência imediata pode não ter noção disto, mas Vivekananda estava incontestavelmente firme. Contudo, já havia uma alegação tácita, uma que receberia expressão mais completa assim que Vivekananda fosse ao circuito de palestra nos Estados Unidos, sobre a superioridade do hinduísmo acima das outras religiões. Ele descreve o hinduísmo como “uma religião que ensinou ao mundo ambos tolerância e aceitação universal”, mas imediatamente parece estar sugerindo que isso pode não ser verdade em outras religiões. Quando adiciona, “acreditamos não apenas na tolerância universal, mas aceitamos todas as religiões como verdadeiras”, há muito mais do que uma dica que o hinduísmo ocupa um lugar único no panteão devido ao fato de que aceita todas as religiões como verdade. “Nós”, os aderentes do hinduísmo, praticamos “tolerância universal”; mas e os aderentes de outras religiões? Falando com sua audiência brevemente em 20 de setembro, Vivekananda aconselhou cristãos que eles “devem sempre estar prontos para criticismo positivo”: chegando na Índia em grande número “para salvar a alma dos pagãos”, eles estavam ainda para entender que “o mal aviltante no Leste não é religião - eles têm religiões suficiente - mas é o pão que os milhões em sofrimento na Índia choram por com gargantas secas.”

Copy of a poster that was hung up around Chicago during the World Parliament of Religions in 1893.

Cópia de um pôster que estava pendurado aos arredores de Chicago durante a Parlamento Mundial das Religiões em 1893.

Tem-se discutido que, tanto quanto seus ensinamentos, foi a vasta impressão de sua personalidade que tornou Vivekananda em uma sensação. O Chicago Inter Ocean relatou que “grandes multidões de pessoas, a maioria dos quais eram mulheres”, chegariam uma hora antes de a sessão da tarde estivesse para começar “pois havia sido anunciado que Swami Vivekananda, o popular monge hindu, que parece muito com o Otelo de McCullough, iria discursar”. O Boston Evening Transcript foi franco de maneira semelhante em sua avaliação de que “as quatro mil pessoas entusiasmadas no Salão de Colombo” estavam preparadas para sentar durante uma hora ou duas de outros discursos com um semblante sorridente “para escutar Vivekananda por quinze minutos”. Harriet Monroe, uma bem conhecida figura nos círculos literários, foi atingida pela voz dele, caracterizando-a como “tão rica quanto um sino de bronze”. Vivekananda chegou nos Estados Unidos com esperanças de encontrar fundos com os quais poderia continuar sua missão na Índia; na América, por outro lado, ele parecia para alguns uma boa aposta comercial, o sábio homem notável do Leste com charme, porte, boa aparência, e comando do inglês. Assim que o Parlamento percebeu isto, Vivekananda foi registrado no circuito de palestras.

(continua)

Ver também Parte I: Antes de Vivekananda