Original Article: Triangulating Trade and Culture: The British Empire, India, and the Making of America
Author: Vinay Lal

*A Triangulação do Comércio e da Cultura: O Império Britânico, A Índia e a Construção da América

Análise de Selling Empire: India in the Making of Britain and America, 1600-1830. Por Jonathan Eacott. (Chapel Hill: Imprensa da Universidade de Carolina do Norte, para o Instituto Omohundro de História e Cultura Americana, Williamsburg, Virginia, 2016. xiii, 455 pp. Cloth, ISBN 978-1-4696-2230-9.)

A maioria das narrativas sobre o lugar da Índia na construção da América giram em torno de alguns temas muito utilizados, começando com Colombo chegando na América e seu grave erro em achar que havia chegado na Índia. O primeiro grande marco dessa narrativa se aproxima do profundo interesse em filosofia Indiana compartilhado por Henry David Thoreau e Ralph Waldo Emerson: há agora um interesse significativo em como a Índia infiltrou-se nas ideias e nas escritas dos Transcendentais Americanos, e eu mesmo escrevi uma tese de Mestrado, que não foi publicada, sobre Emerson e a filosofia Indiana (Universidade Johns Hopkins, 1982). Aqueles que estão familiarizados com Thoreau, por exemplo, poderiam se lembrar de suas famosas linhas inigualáveis em Walden sobre como as águas do lago Walden pareciam se fundir com as águas do Ganga:

De manhã eu banho meu intelecto na filosofia estupenda e cosmogônica de Bhagvat-Geeta, já que seus anos de composição foram decorridos pelos deuses, e em comparação em como nosso mundo moderno e sua literatura parecem ser frágeis e triviais; e eu duvido se essa filosofia não se refere à um estado prévio de existência, tão remota é sua grandeza de nossas concepções. Eu largo o livro e vou para o meu poço para pegar água, e oh! Lá eu encontro o servo de Brahmin, o sacerdote de Brahma e Vishnu e Indra, o qual ainda senta-se no seu templo nos Ganges lendo Vedas, ou habita as raízes de uma árvore com sua crosta e uma jarra de água. Eu encontro seu servo vindo retirar água para seu mestre, e nossos baldes se ralam juntos no mesmo poço. A pura água Walden se mistura com a água sagrada do Ganges.

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Lago Walden, Concord, Massachusetts, 1 Janeiro 1908; fotógrafo: desconhecido. Fonte: Wikipedia, no domínio público.

Thoreau também dedicaria seu capítulo de Terça do A Week on the Concord and Merrimack Rivers em grande parte para discutir alguns textos Indianos dos quais ele fez abundantes citações. Mas, em meio à tudo isso, ele tinha sido, em alguns aspectos, antecipado pelo seu (mais ou menos) mentor Ralph Waldo Emerson—o qual seu primeiro engajamento com a ‘ideia de Índia” poderia ser visto no longo poema chamado Indian Superstition (1821), o qual o jovem estudante escreveu quando tinha apenas dezessete anos, e quem em seu poema Brahma (1856, publicado em 1857) mostrou o quão longe Emerson tinha percorrido na sua compreensão de filosofia Indiana nos 35 anos de intervenção. Mas, para retornar ao assunto principal, depois de umas distrações aqui e ali, onde o misticismo Hindu, yoga, e o interesse em Sânscrito entre alguns acadêmicos são trazidos à tona, e as origens da imigração Indiana nos EUA em aproximadamente 1890 são identificadas, a narrativa do lugar da Índia na construção dos Estados Unidos geralmente se move pro final dos anos 1950 e começo da década de 1960, quando Ghandi quase virou uma palavra comum nos Estados Unidos depois que suas ideias de resistência não-violenta foram adotadas por Martin Luther King, Jr e outros nomes importantes do Movimento de Direitos Civis.

O assunto abrangido por Jonathan Eacott em seu estudo meticulosamente detalhado, Selling Empire, aumenta enormemente nosso conhecimento em como a Índia foi projetada na economia e na imaginação Americana, mas sua ambição é ainda maior quando ele tenta colocar a Índia no sistema imperial Britânico global. O plano de fundo para seu livro é construído por uma concepção mais aprimorada do mundo Atlântico e um interesse recente em estudos do Oceano Índico; mas também há o estímulo do que hoje em dia se chama “histórias interconectadas”. Estudiosos dos territórios Britânicos na América tem raramente se preocupado com o segundo império Britânico no qual a Índia, na fase cliché, era a jóia da coroa; e, assim, estudos da Índia Britânica foram escritos geralmente com indiferença sobre o que estava transpirando no império Britânico na América do Norte. Curiosamente, os dois nomes que aparecem ocasionalmente em tentativas de criação de uma narrativa integrada estão ausentes no estudo de Eacott: Elihu Yale, que acumulou uma fortuna como Governador de Madras (1684-92) antes de ser dispensado por acusações de venalidade e vir a ser o benfeitor de uma faculdade que eventualmente levaria seu nome, e Lord Cornwallis, quem, se alguém tivesse que dizer cinicamente, parece ter sido premiado por render-se à George Washington em Yorktown (1781) com o Governador Geral da Índia (1786-93)./p>

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Algodão pintado e tingido da Índia, 1625-1685, não para o mercado Europeu. Coleção: Museu Victoria & Albert, Londres. Fonte http://demodecouture.com/cotton/

Eacott muda o foco para os séculos XVII e XVIII e sua história pode ser descrita por girar em torno de dois eixos. A questão inicial para comerciantes, mercantilistas e financiadores na Grã-Bretanha era: Poderia a América ser a nova Índia? De que maneira alguém poderia conceber um comércio triangular entre Índia, Grã-Bretanha e as colônias Americanas na América do Norte? Eacott esbanja muita atenção no comércio em calico, e não só por causa de suas populações imensas. 1750-75 banyan, pintado & tingido, Índia (tecido). Destinado ao mercado Europeu.

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Tecido de algodão Indiano (banyan), pintado & tingido, destinado ao mercado Europeu, 1750-1775. Coleção: Museu Victoria & Albert, Londres. Fonte:  http://demodecouture.com/cotton/

Havia muitas expectativas na Grã-Bretanha de que eventualmente os consumidores nas Américas iriam apoiar a Compania do Leste da Índia e assim apoiar o império Britânico e a metrópole (Londres), por onde tudo era afunilado. Porém, Eacott de forma alguma se limita à esse território de algodão, tecidos tingidos, calicos, seda, e lãs: chás e temperos estavam com demanda alta tanto na Grã-Bretanha quanto na América do Norte, mas, de forma totalmente inesperada, também estavam os guarda-chuvas e o narguilé Indiano. Talvez um estudioso com grande senso de jogo, e não tão rígido com a ideia do que constitui trabalho acadêmico, “monografia” acadêmica, e noção de “rigor histórico”, poderia ter feito maravilhas com chá e o narguilé. Há precedentes, para não utilizar outros termos, tanto no marketing de “chai” do Starbucks quanto na proliferação de bares onde se fuma narguilé e restaurantes nas cidades Americanas nos últimos anos.

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O escritor Inglês, Samuel Johnson (1709-1784), na hora do chá: uma impressão por R. Redgrave e H. L. Shenton. Fonte:  http://www.npr.org/sections/thesalt/2015/04/14/398833059/tea-tuesdays-the-evolution-of-tea-sets-from-ancient-legend-to-modern-biometrics

É, entretanto, a discussão de Eacott sobre as ansiedades geradas pelas ideias de um Oriente despótico e efeminado que forma a parte mais surpreendente de seu livro. Montesquieu é visto normalmente como o ponto originário de noções Europeias de “Despotismo Oriental”, mas a peça satírica, Eastward Ho (1605), deu uma expressão considerável à de idea da Ásia, “com sua grande riqueza”, como um “lugar de luxo enfraquecedor” (p. 23). Fabricantes da Índia, uma redação no American Magazine and Historical Chronicle em 1744 anunciou, mostravam um “orgulho espalhafatoso” e precisavam de contenção séria da Grã-Bretanha Protestante (p. 165). O sensual, extravagante e colorido Oriente nunca está muito longe da ideia de excesso. Em ambos os lados do Atlântico, Eacott observa, relatórios de funcionários da Compania desfilando à cavalo e acumulando fortunas “por todos os meios de rapacidade” circularam amplamente (p. 305).

Em sua atenção incomum, então, a questionar a economia política e as políticas de representação, Eacott abre à historiadores novas possibilidades de ligar o primeiro Império da Grã-Bretanha ao Raj Britânico.

 

[Uma versão mais curta dessa análise foi publicada inicialmente no Journal of American History (Junho 2017), 173-74; doi: 10.1093/jahist/jax024]